domingo, 20 de junho de 2010

O estado das coisas

Recentemente coloquei aqui um post sobre uma entrevista de Pedro Costa. Nesse post encontrei no sentido das palavras de Pedro Costa um outro significado que de alguma forma conotei sobre o estado do cinema em Portugal. Por essa razão decidi reflectir um pouco sobre o assunto. Para começar talvez em Pedro Costa esteja reflectida o estado das coisas num aspecto em relação ao cinema em Portugal. O seu último filme Ne Change Rien teve estreia em Espanha no passado dia 11 de Junho, mais concretamente em Madrid e Barcelona bem como vai ter projecção em três salas no Japão: Tóquio, Osaka e Hiroshima. É um caso entre poucos que tem obtido reconhecimento internacional. Outro realizador português e também muito reconhecido a nível internacional é Manuel de Oliveira que é o realizador  mais velho do mundo. São imensas as suas obras, das quais destaco a última O Estranho caso de Angélica.


Estes dois exemplos são poucos onde deveriam existir muitos. Mas onde está o problema no cinema em Portugal? Numa entrevista dada ou Correio da Manhã Paulo Branco foi capaz de responder a essa pergunta identificando alguns pontos onde o cinema em Portugal sofre problemas. A entrevista é de 2009, mas infelizmente ainda continua recente e bem presente. Deixo algumas partes que considero que tocam nos pontos essenciais. Não podemos esquecer que Paulo Branco é outro homem que no cenário internacional também detém alguma reputação.

Como está o estado actual do cinema em Portugal?


A época de ouro do cinema português, anos 80 e 90, quando apareceram pessoas como o Pedro Costa, o Manoel de Oliveira, oJoão César Monteiro, a Teresa Villaverde, o João Botelho, e hoje, a comunidade política e a comunicação social têm tendência a esquecer-se desse período que levou o cinema português além-fronteiras. A qualidade do cinema em Portugal só foi possível graças a uma estrutura que, mal ou bem, resistiu às mudanças de governo, às mudanças de ministros. Essas estrutura é que tem de ser reforçada e não questionada. O Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA), com as diversas denominações que teve ao longo dos tempos, foi o instrumento número um, que possibilitou ao cinema português ter aquela áurea enorme técnica.

(....)

Então o que passa no cenário actual do cinema?

Há uma grande ignorância e novo-riquismo os decisores que estremeceram, nos últimos três anos, esta estrutura que é indispensável e devia ter mais fundos para além da taxa dos quatro porcento. Em vez de ter havido o reforço dos meios do ICA, houve um deslumbramento para caçar, a qualquer preço, espectadores. O grande cinema não pode ser feito com esse espírito. Mais do que isso, houve um desvio de uma lei que nos punha ao nível da Europa e que, de certa forma, obrigava qualquer operador audiovisual a investir em cinema e audiovisual. Isso foi transformado num projecto que só tem trazido a pior confusão e um grande oportunismo. É quase um caso de polícia.

Está a falar do Fundo de Investimento no Cinema e Audiovisual (FICA)?

Sim, é um discurso demagogo e aldrabão e uma caça ao dinheiro do Estado, através do Ministério de Economia. Este fundo é uma lei desviada dos contornos originais e que promete retornos impossíveis de obter. É um monstro, um aborto, que não tem nada a ver com critérios culturais. Mesmo que um filme faça 300 mil espectadores, o retorno ao produtor são 150 mil euros e os filmes são feitos com, pelo menos, um milhão e meio ou dois milhões de euros. Portanto não há retorno (como é regra para obtenção do fundo). A Lei que devia fomentar a cultura acabou por ser esquecida e desviada.
(...)
Os filmes apoiados pelo FICA não conseguem então cumprir a regra do retorno relativa a este fundo?
É uma profusão de audiovisual de baixa qualidade mas não consegue espectadores para dar retorno nem sequer a nível cultural. Só dá uma imagem do país inacreditável e ‘inexportável’.

Então acha que se devia abolir o FICA?

O FICA nunca devia ter existido. A única estrutura que devia gerir o audiovisual em Portugal era o ICA e sem permitir baixar a qualidade. Não sei quem vai querer comprar, lá fora, o ‘Equador’ e é inacreditável que o primeiro produto audiovisual sobre Salazar tenha sido aquilo (‘A Vida Privada de Salazar’). Estamos muito abaixo de Berlusconi. E isto tem sido feito com o beneplácito do próprio ministro da Cultura que diz que isto não tem nada a ver com ele e adoptou a posição de avestruz.

E o ICA serve os propósitos do cinema português?

Tenho muitas críticas ao funcionamento da instituição mas não ponho em causa a estrutura. Quero é o reforço da estrutura com um reforço de verbas e responsabilização na promoção e desenvolvimento da produção audiovisual, além da cinematográfica, e com critérios de qualidade. Deviam ser criadas condições para que o ICA funcionasse melhor: deixasse esta burocratização excessiva e reforçasse as suas receitas – até podia ser com o reforço de 1% do volume de negócios das televisões privadas –, ter uma maior preocupação na distribuição e exibição e uma transparência no apoio a festivais. E rever o incentivo a primeiras obras, assim é difícil surgirem novos realizadores...

Sem comentários:

Reaprender

 Nunca é fácil quando conhecemos uma pessoa. Principalmente se por essa pessoa começarmos a sentir sentimentos.  É uma roda viva de emoções ...